Capítulo 14 EM BUSCA DA VERDADE HISTÓRICA
É bastante óbvio que não pode haver duas verdades incongruentes sobre a natureza humana de Cristo. Todavia, alguns tentam harmonizar ambas as posições como se as diferenças fossem de pouca monta. Outros ainda sugerem que os dois pontos de vista realmente se realçam um ao outro.
Independentemente do mérito, isso parece uma tentativa de reconciliação com pouca chance de sucesso. Pelo contrário, a vigorosa reação dos membros da igreja e as críticas já destacadas de alguns teólogos, mostram que a controvérsia está mui longe de ser resolvida. Contudo, o período compreendido entre 1986 e 1994 marcou um certo reavivamento da Cristologia tradicional.
Se é verdade que um grande número de adventistas hoje desconhecem a posição histórica da igreja sobre o assunto, também é verdade que estudos recentes feitos por pesquisadores contemporâneos acham-se agora disponíveis para recordá-la.
Um Século de Cristologia Adventista
O primeiro estudo, publicado em 1986, foi o de Ralph Larson e teve por título The Word Was Made Flesh: One Hundred Years of Adventist Christology (O Verbo Se Fez Carne: Cem Anos de Cristologia Adventista). Esse livro é a mais completa obra sobre o assunto, do ponto de vista essencialmente histórico.
Ralph Larson estudou teologia na Andrews University e obteve seu doutorado na AndoverNewton Seminary, na cidade de Boston. Por 40 anos ele serviu à Igreja Adventista como pastor, evangelista, secretário departamental, missionário e professor de teologia. Seu último cargo antes da aposentadoria foi a presidência do seminário teológico das Filipinas.
Por muitos anos Larson analisou sistematicamente a literatura oficial da igreja publicada entre 1852 e 1952, colecionando cuidadosamente as declarações sobre Cristologia nela havidas. Assim ele foi capaz de indexar cerca de 1.200 citações, das quais mais de 400 procedentes da pena de Ellen White e arranjadas em seqüência cronológica. Com isso Larson esperava prover comprovação para o que havia sido a crença adventista sobre a natureza humana de Cristo entre 1852 e 1952.
O objetivo de Larson não era fazer um estudo escriturístico ou teológico, mas simplesmente “estabelecer o que os adventistas haviam crido e não por que haviam crido”. O mais importante era que ele desejava que todos estivessem cientes da principal questão e assunto da controvérsia: “O Cristo encarnado veio à Terra com a natureza humana de Adão em estado de santidade, ou com a natureza humana do homem caído?”
Primeiramente Larson tentou clarificar as expressões-chave usadas pelos pioneiros, particularmente aquelas utilizadas por Ellen White, tais como “natureza pecaminosa”, “natureza decaída”, “natureza pecaminosa herdada”, etc., e elucidar os sentidos das palavras “paixão” e “propensão, dependendo de serem ou não atribuídas a Cristo ou à parte de Sua natureza.”805 Finalmente ele tentou colocar certas declarações contidas na carta de Ellen White a W. H. L. Baker em seu contextos histórico-literário.806
Baseado em sua coleção de citações, Larson vê uma “era de lucidez” durante a qual “a igreja fala em uníssono” (1852-1952), e após a qual segue a “era de confusão” (seção 4), de 1952 em diante. As últimas três seções são dedicadas a enfatizar a estreita conexão entre Cristologia e Soteriologia.
E prossegue dando a entender que Larson gentilmente discordou da nova teologia.808 Ele considerava que seu lançamento no Ministry, em Questions on Doctrine e em Movement of Destiny tinha exercido um incalculável grau de influência, promovendo confusão entre os adventistas pelo mundo afora.
Ela fez parecer que Ellen White falara em termos contraditórios e que o adventismo histórico havia estado enganado acerca da doutrina da salvação. Larson expressou sua crença de que a “Cristologia, a natureza de Cristo, a Soteriologia e a obra salvífica de Cristo estão inseparável e intimamente ligadas. Quando falamos de uma, inevitavelmente falamos de outra. Quando mudamos uma, inevitavelmente mudamos outra”.809
A obra de Larson provê uma fonte de informações sem precedente. Sua análise críticohistórica ilumina a quem deseja estar informado com respeito ao ensino unânime da igreja desde 1852 a 1952, e sobre a mudança que teve lugar nos anos cinqüenta.
Em conclusão, Larson convidou seus leitores a comprovarem os resultados de sua pesquisa, e não meramente aceitá-la ou rejeitá-la sem estudo pessoal. Em caso de erros de interpretação, ele Douglas e Eric C. Webster achava que a igreja deveria ter a coragem de admiti-los e corrigi-los.
O Patrimônio White é Solicitado a Posicionar-se
Como membro da mesa diretiva dos Depositários de Ellen G. White, eu não poderia permanecer indiferente à crescente controvérsia, particularmente porque suas origens foram fundamentadas em muitas declarações de Ellen G. White com respeito à natureza humana de Cristo. Eu cria que o Patrimônio Ellen G. White, comissionado para cuidar dos escritos de Ellen White, deveria falar claramente como houvera feito em muitas ocasiões.
Em setembro de 1985, aceitei um convite para dar um curso de Cristologia na faculdade adventista de teologia, na França. Pareceu-me imperativo cientificar meus alunos sobre a controvérsia no setor de fala inglesa do mundo adventista. Para seu benefício, preparei um manual que foi a primeira seleção histórica da Cristologia adventista em francês.
Essa era uma oportunidade sem igual para eu avaliar a magnitude do problema e alimentar a esperança de sua solução. Achei que o Patrimônio White deveria discutir o assunto e declarar-se a respeito da Cristologia de Ellen G. White. Sugeri a seu presidente, Kenneth H. Wood, que o item fosse posto na agenda da reunião anual.
Minha carta de 9 de julho de 1986 não foi uma sugestão para a tentativa de uma nova exegese das declarações de Ellen White, ou para formular uma crítica de uma ou outra das teses em voga. Propus, antes, que se verificasse mais detidamente a posição de Ellen White, bem como sua avaliação do ensino de seus contemporâneos Waggoner, Jones, Prescott e Haskell sobre o assunto, cujas posições ela aprovava.
Em carta de retorno, Kenneth Wood avisou-me que ele concordava com minha sugestão, e que o item estaria na agenda da IV Reunião. Ao mesmo tempo, todavia, Robert W. Olson, secretário do Patrimônio de Ellen G. White, informou-me que essa não era uma questão que o Patrimônio White deveria resolver.
“O Patrimônio White nunca emitiu um documento sobre Cristologia. Tenho para mim que a única razão pra isso é que não concordamos entre nós mesmos sobre uma conclusão definitiva... Considerando o fato de que há, pelo menos, duas diferentes escolas de pensamento entre nós, senti que não seria prudente para o Patrimônio White tentar decidir quem está certo e quem está errado. Uma vez feito isso e nos colocaríamos numa posição confrontativa contra todos aqueles que discordam de nós.”
No entanto, conquanto favorável à idéia de uma discussão na IV Reunião, Robert Olson desejava ter os dois pontos de vista representados. Olson sugeriu a apresentação de um documento no qual ele próprio expressaria sua opinião. Sem esperar por uma resposta, ele me enviou um sumário de suas idéias em duas cartas datadas de abril e setembro de 1986.
O Ponto de Vista de Robert Olson
Em sua carta de 21 de abril de 1986, Robert Olson sumariou para meu benefício sua compreensão do problema. “Minha opinião pessoal sobre o aspecto-chave da questão é que Cristo não possuía tendências hereditárias para pecar, mas como meu substituto Ele foi capaz de experimentar todos os meus sentimentos, para que pudesse entender plenamente a natureza de minhas tentações.”816
“Pessoalmente acho que Cristo foi diferente de nós em Seu nascimento. Lucas 1:35 diz-me isso. Ele era santo quando nasceu; por outro lado, eu, ao nascer, não o era. Cristo nunca precisou de conversão, mas nós sim. Sei que o tema é pleno de muitos mistérios que nos são realmente incompreensíveis. Creio, todavia, que Ele foi capaz de tomar meus pecados sobre Si e experimentar as sensações da alma perdida sobre a cruz; que Lhe foi possível experimentar minha natural inclinação para o mal, sem assumir esse pendor.”
Em sua segunda carta, datada do dia 3 de setembro de 1986, Olson mais uma vez foi ao cerne do problema: “Penso, particularmente, se Jesus herdou tendências pecaminosas de Sua mãe. O Pr. Wood acha que Ele as teve; minha opinião é que não, mas que em certas ocasiões de Sua existência terrena Ele experimentou vicariamente o que é possuir tendências pecaminosas.
Em outras palavras, creio que Jesus aceitou, às vezes, minhas tendências pecaminosas de maneira vicária, do mesmo modo que tomou minhas culpas. Se eu puder explicar uma, posso explicar outra. Pode ser que estejamos aqui falando sobre algo que seja inexplicável.”
Olson publicou seus pontos de vista durante um seminário havido na Andrews University, de 14 a 24 de julho de 1986. Depois de dois contraditórios artigos publicados no Ministry, em junho de 1985, e da crítica que eles provocaram, o assunto da natureza humana de Cristo turnou-se uma questão candente. Em resposta, Olson preparou um resumo de três páginas contendo questões respondidas diretamente com o uso de textos extraídos do Novo Testamento e dos escritos de Ellen White.
Em 1989, Olson deu a público um panfleto muito elaborado sob o título The Humanity of Christ (A Humanidade de Cristo), no formato de um programa de estudos. Escreveu que, “o propósito deste pequeno livro é apresentar um acurado retrato de nosso Senhor em Sua humanidade. Visto que Ellen G. White conheceu Jesus tão bem e que ela própria conversou com Ele em visão... temos citado abundantemente, mas ainda mui longe de fazê-lo exaustivamente, seus escritos bem como as Santas Escrituras.”820
Porque essa compilação foi feita em nome do Patrimônio de Ellen G. White, seu secretário procurou manter-se o mais possível no terreno da neutralidade. Essa brochura constitui-se numa excelente fonte para quem deseja saber as respostas de Ellen White às perguntas de Robert Olson. Entretanto, uma vez que alguém queira interpretar à vontade as citações providas como respostas, o problema permanece.
Discussão Sobre Cristologia no Patrimônio White
A IV Reunião teve lugar em Williamsburg, Virgínia, de 23 a 25 de janeiro de 1987. Por causa de uma tremenda tempestade de neve que paralisou todo o tráfego da costa oeste dos Estados Unidos, o encontro foi transferido para Columbia, Maryland. Posteriormente, foi ela condensada num só dia. Toda a sessão foi dedicada ao problema da natureza humana de Cristo baseada em minha apresentação.
Seu conteúdo foi essencialmente aquele exposto na segunda parte deste estudo, a qual foi dedicada à Cristologia dos pioneiros. Ela também continha uma crítica à nova teologia, que seria discutida com mais detalhes na quinta parte do livro.822
Outros documentos foram preparados mas não puderam ser apresentados por falta de tempo. De qualquer modo, os textos foram incluídos no volumoso registro da IV Reunião. Dois deles, em especial, têm relação direta com nosso tema e merecem consideração.
Tim Poirier e as Fontes da Cristologia de Ellen White
Tim Poirier, secretário-associado e arquivista do Patrimônio de Ellen G. White, preparou um estudo comparativo entre a Cristologia de Ellen White e a dos autores de cuja linguagem ela aparentemente se utilizou. De acordo com Poirier, essas fontes são úteis no esclarecimento da Cristologia de Ellen White.
Um pregador anglicano, Henry Melvill (17981871), foi uma das fontes de que Ellen White se serviu para escrever seu artigo Christ, Man’s Example (Cristo, o Exemplo do Homem), publicado na Review and Herald de 5 de julho de 1887. O Patrimônio White conserva um exemplar dos Sermões de Melvill. Poirier encontrou o sermão de Melvill denominado The Humiliation of the Man Christ Jesus (A Humilhação do Homem Cristo Jesus), de especial valor para esclarecer o significado de algumas expressões de Ellen White com respeito à humanidade de Cristo.
De acordo com Melvill, a queda de Adão teve duas conseqüências fundamentais: (1ª) “simples debilidades” e (2ª) “propensões pecaminosas”. Em “simples debilidades”, Melvill incluiu fome, sofrimento, fraqueza e tristeza. Por “propensão pecaminosa” ele entendia “tendência para pecar”. No fecho de seu argumento Melvill concluiu: “Antes da queda, Adão não possuía ‘simples debilidades’ nem ‘propensões pecaminosas’; nós nascemos com ambas; Cristo assumiu as primeiras mas não as segundas.”
Conseqüentemente, “a humanidade de Cristo não foi a adâmica, isto é, a humanidade de Adão antes da queda; nem a humanidade decaída em cada aspecto da humanidade de Adão após a queda. Não foi a adâmica porque ela possuía as simples debilidades da decaída. Não foi a decaída porque a humanidade de Jesus nunca baixou à impureza moral. Foi, portanto, mais literalmente a nossa humanidade, mas sem pecado.”
Poirier também comparou a linguagem de Ellen White com a de Octavius Winslow, para mostrar que ambos usaram o termo propensão, limitação, e tendência no mesmo sentido e em harmonia com Melvill. Poirier colocou as passagens de Ellen White ao lado dos textos cristológicos de Winslow , dos quais ela havia tomado emprestados termos, expressões e mesmo conceitos.
Mas isso significa que Ellen White tinha idêntico ponto de vista? Um exame cuidadoso das evidências permite-nos chegar a outra conclusão.
Em seu argumento, Winslow chegou à conclusão de que em a natureza humana de Cristo “não havia qualquer sinal de princípios corruptos ou propensões; nem operavam quaisquer desejos e tendências; pois até o momento de Sua vinda à Terra, nenhum anjo do Céu permaneceu diante do trono mais puro e mais imaculado do que Ele (The Glory of the Redeemer - A Glória do Redentor, pág. 129, 132-134).”
No excerto comparativo apresentado por Poirier, Ellen White empregou essencialmente a mesma linguagem, mas aplicou-a a Adão antes da queda e não a Cristo. “Não havia princípios corruptos no primeiro Adão, nem corrompidas propensões e tendências para o mal. Adão era irrepreensível como os anjos diante do trono de Deus.”
E na citação precedente, também posta em paralelo com o texto de Winslow, Ellen White escreveu sobre Cristo: “Aqui a provação de Cristo foi muito maior do que a de Adão e Eva, pois Ele assumiu nossa natureza, decaída mas não corrompida, e que não se perverteria a menos que Ele aceitasse as palavras de Satanás em lugar das palavras de Deus.”
É verdade que Ellen White usou palavras e expressões de outros teólogos. Mas isso necessariamente não implica que ela as utilizou para dizer as mesmas coisas. Assim, por exemplo, Winslow afirmou que “a exposição de nosso Senhor à tentação e Sua conseqüente capacidade de resistir às suas solicitações, tem o fundamento em Sua perfeita humanidade.”
Ellen White empregou a mesma expressão desta maneira: “A perfeita humanidade de Cristo é a mesma que o homem pode possuir através da ligação com Ele.” Em outras palavras, enquanto Winslow aplica a expressão à natureza humana de Cristo, herdada desde o nascimento, Ellen White diz que podemos ter a mesma “perfeita humanidade” que Ele possuía.
Com relação ao argumento de Melville de que Cristo tinha apenas “simples fraquezas”, é importante destacar que uma pesquisa do CDROM de Ellen G. White indica que ela nunca empregou tal expressão. Certamente EGW fez múltiplas menções das “fraquezas” que Cristo suportou, mas nunca as qualificou como “simples”. Contrariamente, ela repetidamente fala que “Cristo tomou sobre si as fraquezas da humanidade degenerada”.
Ou que “Cristo suportou os pecados e fraquezas da raça como eles existiam quando Ele veio à Terra para socorrer o homem.” Assim, não é suficiente comparar palavras e expressões; seu uso também precisa ser verificado.
D. A. Delafield Confirma a Cristologia de Ellen White
O terceiro documento contido nos registros da IV Reunião procedeu da pena de D. A. Delafield, um dos decanos do Patrimônio White. Como secretário-associado, ele era mundialmente conhecido por seus seminários sobre o Espírito de Profecia e pelos numerosos artigos abordando vários aspectos dos escritos de Ellen White.
Na Europa, ele e sua esposa são especialmente lembrados em razão do ano em que passaram ensinando sobre o Espírito de Profecia nas igrejas, e por causa de seu livro tratando das visitas de Ellen White a diferentes países europeus.
O estudo preparado para Williamsburg trouxe o seguinte título: The Credentials of the True Prophet (As Credenciais do Verdadeiro Profeta).
Entre essas credenciais Delafield citou I João 4:13, que ele considerava o selo do testemunho cristão. De acordo com ele, Ellen White fez da Cristologia seu tema permanente, conforme é indicado no Index to the Writings of Ellen G. White (Índice dos Escritos de Ellen G. White). Sob o verbete Cristo estão 87 páginas de referências, todas dedicadas a Cristo como encarnado e impecável, o qual morreu pelos pecados dos homens.
Delafield escreveu: “Sempre que estudarmos o assunto da Encarnação, deveríamos ter em mente o fato central: Jesus viveu vitoriosamente em carne humana real - carne decaída, mas não corrompida.” Então, apoiando-se numa declaração de Ellen White, ele especificou: “Nosso Senhor foi tentado como o homem é tentado.
Ele era capaz de ceder à tentação, como o são os seres humanos... Aqui, a provação de Cristo foi muito maior do que a de Adão e Eva, pois Ele tomou nossa natureza, decaída mas não corrompida, e que não seria corrompida a menos que Ele aceitasse as palavras de Satanás em lugar das palavras de Deus.”841
Delafield sublinhou o fato de que Cristo era “caído mas não corrompido”, citando a carta a Baker: “Nunca, de modo algum, deixai a mais leve impressão sobre mentes humanas de que uma mancha ou inclinação para a corrupção existiam em Cristo, ou que Ele de alguma maneira cedeu à corrupção... Que cada ser humano seja advertido sobre fazer Cristo totalmente humano, tal como qualquer um de nós; pois isso não pode ser.” (The SDA Bible Commentary, vol. 5, págs. 1128, 1129).”
Para Delafield, “Jesus realizou o que nenhum outro ser humano fez antes dEle: viver uma vida sem pecado, sem mancha e incorruptível em Sua carne humana... Mesmo Seus inimigos reconheciam-Lhe a inocência. Pilatos (Lucas 23:14); sua esposa (Mat. 27:19) e também os próprios demônios (Marcos 1:24) O declararam ‘o Santo de Deus’”.
Delafield concluiu com uma citação de Ellen White: “‘Ele enfrentou todas as tentações com que Adão foi assaltado, e as venceu porque, em Sua humanidade, Se apoiava no poder divino... A vida de Cristo é uma revelação do que os decaídos seres humanos podem tornar-se através da união e companheirismo com a natureza divina’ (The Faith I Live By, Fé Pela Qual Eu Vivo, pág. 219).” Delafield expressou sua convicção de que essa era a Cristologia dos pioneiros da Igreja Adventista.
George R. Knight Confirma a Cristologia dos Pioneiros
Dentre as declarações sobre a história da Cristologia Adventista, as de George R. Knight são especialmente valiosas. Professor de História da Igreja na Andrews University, Michigan, Knight é claro em sua opinião objetiva sobre a crença adventista acerca da natureza humana de Cristo, desde o início do movimento. A maioria de suas obras é dedicada aos vários aspectos da história da Igreja Adventista.
O que o levou a escrever sobre a natureza humana de Cristo originou-se do caso de A. T. Jones. Um capítulo completo é dedicado a detalhada análise do ensino de Jones quanto à natureza de Cristo. São de interesse especial, porém, as observações de Knight sobre a história da Cristologia Adventista em geral. Ele acentuou que “Waggoner, Jones e Prescott... desenvolveram o conceito de que Cristo era exatamente como qualquer outro filho de Adão – incluindo a tendência para pecar – , na característica central de sua doutrina da justiça pela fé.”
Mas, observou ele que “seu ponto de vista sobre a natureza de Cristo não criou controvérsias no adventismo da década de 1890. A opinião era geralmente aceita como um ponto teológico não litigioso. Isso tudo mudaria na década de 1950, quando se tornaria o tema teológico para muitos adventistas sobre ambos os lados da questão.”
“M. L. Andreasen, um dos principais teólogos denominacionais dos anos 50, sustentava que a doutrina da natureza pecaminosa de Cristo é um dos ‘pilares fundamentais’ do adventismo. Mudar essa posição, atestou ele, não foi apenas abandonar o adventismo histórico, mas também abjurar a crença nos testemunhos de Ellen White.
Muitos têm seguido esse caminho. Outros, na igreja, crêem que uma fé adequada em Cristo precisa reconhecer que Ele foi diferente dos outros seres humanos em suas tendências para o pecado. Por 30 anos o adventismo tem vivido uma guerra de palavras sobre o tópico.”
“A natureza de Cristo não era um ponto divisivo nos círculos adventistas até os anos 50. Até esse tempo os escritores denominacionais haviam estado em harmonia com Jones, Waggoner e Prescott, acerca de ter Cristo vindo em carne humana a qual detinha, como a do decaído Adão, todas as tendências da humanidade para pecar.”
De acordo com Knight, dois fatores motivaram a mudança teológica no anos 50. Um deles foi a descoberta, em 1955, da carta de Ellen White a W. L. H. Baker. Outro foi a sensibilidade de alguns líderes da igreja “à crítica de certos evangélicos de que a Cristologia de ‘tendências pecaminosas’ dos adventistas era inadequada.”
Porém, afirmou Knight, havia uma profusão de declarações de Ellen White afirmando que Cristo “tomou sobre Si nossa pecaminosa natureza”, ou “que Ele tomou sobre Si próprio a decaída e sofredora natureza humana, degradada e poluída pelo pecado”. E acrescenta o autor: “Essas não foram afirmações isoladas.” No mesmo ano da carta a Baker, ela escreveu que “Cristo assumiu a natureza humana decaída.”
Por fim, Knight asseverou: “Não há a mais leve dúvida de que Ellen White cria que Cristo assumiu a natureza humana decaída e pecaminosa na Encarnação. O que quer que ela consistisse, todavia, fica claro que não estavam incluíadas as más propensões para o pecado – ‘os cardos e as roseiras bravas’ do egoísmo, do amor próprio e assim por diante.”
Não é fácil averiguar o ponto de vista de Knight sobre o assunto. Sua análise objetiva como historiador confirma, todavia, o que os defensores da Cristologia histórica sempre afirmaram. O objetivo de seu livro não foi dizer o que ele próprio cria, mas atestar o que os adventistas crêem e explicar como ocorreu a mudança radical em sua Cristologia nos anos 50.
Uma Exposição Bíblica no Nisto Cremos
Durante a sessão da Conferência Geral de 1980 foi preparada uma nova declaração de crenças. Muitas vezes, desde a primeira declaração de fé em 1872, os líderes da Igreja Adventista do Sétimo Dia compreenderam a necessidade de reafirmar suas crenças fundamentais, de forma a torná-las cada vez mais claras.
Para esse fim, a Associação Ministerial da Conferência Geral tomou a iniciativa de preparar “uma exposição bíblica das 27 doutrinas fundamentais dos adventistas do sétimo dia” , e pô-las num livro que veio à luz em 1988, e foi traduzido e distribuído em muitas das principais línguas do mundo.
Vários autores foram escolhidos para redigir os artigos, enquanto uma comissão de 194 membros escolhidos dentre as 10 divisões mundiais, foram comissionados a criticar cada capítulo. Uma comissão menor, composta de 27 líderes da igreja, teólogos e pastores, reuniram-se regularmente para supervisionar a preparação da obra.
Embora o livro parecesse ser uma declaração oficial, os editores tomaram o cuidado de enfatizar: “Enquanto esse volume não for oficialmente votado – e somente a Conferência Geral em sessão mundial pode realizar isso – ele pode ser visto como representante da ‘verdade ... em Jesus’ (Efés. 4:21), que os adventistas do sétimo dia ao redor do mundo estimam e proclamam.”
Por causa das diferenças de opinião, a declaração votada na sessão da Conferência Geral de 1980 evitou definir a natureza humana de Cristo de maneira precisa. Ela meramente afirmou que Jesus era “Deus verdadeira e eternamente” e “verdadeiramente homem”. “Ele foi concebido do Espírito Santo e nascido da virgem Maria. Viveu e sofreu tentações como um ser humano, mas exemplificou perfeitamente a justiça e o amor de Deus.”
A referida sessão apurou, todavia, que no capítulo 4 do Nisto Cremos não faltaram detalhes precisos com referência aos vários aspectos da Cristologia. Em particular, a natureza humana de Cristo foi ali desenvolvida de maneira sistemática a partir de textos bíblicos.
Jesus foi apresentado como “verdadeiramente homem”. “Ele podia reivindicar verdadeira humanidade através de Sua mãe”; “durante Sua juventude Ele esteve sujeito a Seus pais (Lucas 2:51)”; “o nome Filho do homem enfatiza Sua solidariedade com a raça humana mediante a Encarnação.”
A questão controversa foi claramente colocada: “Em que extensão Ele [Cristo] Se identificou com ou tornou-Se idêntico à decaída humanidade? Um correto ponto de vista sobre a expressão ‘à semelhança de carne pecaminosa’, ou homem pecaminoso, é crucial. Opiniões inexatas têm promovido discussão e contenda através da história da igreja cristã.”860
O capítulo usa expressões típicas do ensino tradicional da Igreja Adventista: “Ele revestiu Sua divindade da humanidade; tornou-Se em ‘semelhança de carne pecaminosa’, ‘natureza humana pecaminosa’ ou ‘natureza humana decaída’ (cf. Rom. 8:3) Isso de nenhum modo indica que Jesus foi pecaminoso ou participou de atos ou pensamentos pecaminosos. Embora em forma ou semelhança de carne pecaminosa, Ele foi sem pecado e Sua inocência está fora de questão.”
A natureza humana de Jesus não foi identificada com a de Adão antes da queda. “Cristo tomou a natureza humana que, comparada com a natureza não decaída de Adão, decresceu em força física e mental, embora Ele nunca houvesse pecado. Quando Cristo assumiu a natureza humana que portava as conseqüências do pecado, tornou-Se objeto de fraquezas e inclinações que todos experimentam. Sua natureza humana estava ‘assolada por fraquezas’ou ‘cercada de debilidades’ (Heb. 5:2; Mat. 8:17; Isa. 53:4).”
Com referência às declarações do bispo anglicano Henry Melvill, afirmou-se: “A humanidade de Cristo não era a adâmica, isto é, a humanidade de Adão antes da queda; nem a humanidade decaída, ou seja, em cada aspecto da humanidade de Adão pós-queda. Não era a adâmica porque ela possuía as simples fraquezas da decaída. Não era a decaída porque ela nunca havia descido à impureza moral. Ela era, portanto, mais literalmente a nossa humanidade, mas sem pecado.”863
Finalmente, com referência ao problema da tentação, “o modo como enfrentou a tentação prova que Ele era verdadeiramente humano. Que Cristo fosse ‘tentado em todos os pontos como nós’ (Heb. 4:15), mostra que Ele era participante da natureza humana. Tentação e a possibilidade de pecar eram reais para Cristo. Se Ele não pudesse pecar, não teria sido humano e nem poderia ser nosso exemplo. Cristo assumiu a natureza humana com todos os seus riscos, incluindo a possibilidade de ceder à tentação.”
Para realçar a realidade das tentações a que Cristo estava sujeito, dois teólogos bem conhecidos foram citados. “Concordamos com Philip Schaff, que disse: ‘Houvesse Ele sido dotado desde o início de absoluta impecabilidade, ou com a impossibilidade de pecar, e não poderia ter sido um homem real, nem nosso modelo para imitação; Sua santidade, em lugar de ser um feito auto-adquirido ou de mérito próprio, teria sido acidental ou dom exterior, e Suas tentações um show fantasioso.’
Karl Ullmann acrescenta: ‘A história da tentação, conquanto possa ser explicada, não teria significado; e a expressão na epístola aos Hebreus: ‘foi tentado em todas os pontos como nós’, seria sem sentido.’”
Segundo essas declarações, alguém só pode ficar espantado ao ler que “a natureza humana de Cristo tenha sido retratada como impecável”; que “Jesus Cristo tomou sobre Si nossa natureza com todos os seus riscos, mas que Ele estava livre da corrupção hereditária ou degradação e do pecado.” Ou que “Jesus não possuía más propensões ou inclinações, ou mesmo paixões pecaminosas.” Certamente Cristo nada teve desse tipo. Ele nos deu “o exemplo de uma vida sem pecado”. Mas isso foi realizado em a “natureza humana decaída” sujeita à “operação da grande lei da hereditariedade.” Mesmo que não tivesse más inclinações, “Ele sabia quão fortes eram as inclinações do coração natural.” E por que falar, como Melvill, de “simples fraquezas”, quando Ellen White declara que “Cristo tomou sobre Si as fraquezas da humanidade degenerada”?
De qualquer modo, em outros aspectos a Cristologia apresentada no Nisto Cremos confirma a posição pós-queda. Portanto, limitando a hereditariedade de Cristo apenas às conseqüências físicas – a “simples fraquezas”872 – os autores se afastaram da posição tradicional num ponto muito importante. Assim fazendo, o Nisto Cremos estabeleceu uma interpretação intermediária sobre a natureza humana de Cristo, a qual Roy Adams tentou divulgar por meio de seus artigos na Adventist Review e no livro The Nature of Christ: Help for a Church Divided Over Perfection (A Natureza de Cristo: Auxílio a uma Igreja Dividida Sobre a Perfeição).
Roy Adams Busca Reacender o Debate
Depois dos debates dos anos oitenta, a Adventist Review publicou uma série de seis artigos de autoria de Norman R. Gulley sob títulos como “Model or Substitute, Does it Matter How We See Jesus?” (Modelo ou Substituto: Importa Como Nós Vemos a Jesus)?” e “Pressing Together”.
Esses artigos incluíam alguns conceitos próprios de Gulley, tais como “Jesus tornou-se pecado por nós vicariamente”; “Jesus não experimentou tentações como as nossas, porque Sua natureza era diferente da nossa”; e Ellen White “via a missão de Cristo em duas dimensões. Ela fala de uma dimensão pré e de uma dimensão pós-queda.”
Na primavera de 1990, Roy Adams, editorassociado da Review, reacendeu o debate ao publicar três editoriais sobre se Cristo era como Adão (antes da queda) ou como os pecadores.
Esses artigos tiveram como título: “Como Adão ou Como Nós?” Adams cita Ellen White: “Quando quisermos um profundo problema para estudar, fixemos nossas mentes sobre o mais maravilhoso fato que teve lugar na Terra ou no Céu – a encarnação do Filho de Deus.” “Essa é a doutrina central da fé cristã.” E acrescenta: “Sem ela todo o cânon das Escrituras se torna um documento sem significado, um absurdo.”
“O problema que enfrentamos aqui é semelhante àquele encarado por nossos pioneiros cristãos nos primeiros séculos – a falta de uma definida declaração na Escritura. Essa é a razão por que os adventistas se têm apoiado tão maciçamente nos escritos de Ellen White sobre essa questão.”
Adams mostrou que Ellen White afirma peremptoriamente, por um lado, que Cristo era semelhante a nós em todas as coisas, e por outro, que Ele era, ao mesmo tempo, “diferente de nós”. A dificuldade jaz na aparente contradição: “Se Cristo, de fato, tornou-Se humano, como foi Ele capaz de contornar a infecção universal do pecado?”
Para explicar esse paradoxo, Adams apelou para Henry Melvill, o ministro anglicano que afirmava que os dois resultados essenciais da queda foram (1) “simples fraquezas” e (2) “propensões pecaminosas” Agora, concordando com Melvill, “antes da queda, Adão não possuía ‘simples fraquezas’, nem ‘propensões pecaminosas’. Somos nascidos com ambas, e ... Cristo tomou as primeiras, mas não as segundas”. Adams concluiu, como Melvill, que “o encarnado Cristo não era nem como Adão antes da queda, nem como nós. Ele era sem igual.”880
Essa é a solução proposta por Adams em seu livro (publicado em 1994) sobre a natureza de Cristo. Tendo criticado a Cristologia de alguns “irmãos rebelados” da herança de Jones e Waggoner, bem como a enérgica reação de Andreasen contra a nova teologia, ele desenvolveu as idéias contidas em seus editoriais. Em particular, Adams recunhou em detalhes a explanação de Melvill. E, como Tim Poirier, considerou que Ellen White, por ter usado as mesmas expressões, deve-lhes ter dado o mesmo significado.
Como outros antes dele, Adams justificou seu ponto de vista citando extensivamente a carta de Ellen White a Baker. Posteriormente, revelou que sua interpretação corresponde àquela de seus professores de teologia.
Reconhecemos que a interpretação de Roy Adams representa positivamente a postura mantida por grande parte dos adventistas hoje. Todavia, seria errôneo concluir que esse ponto de vista é partilhado pela maioria na Igreja Adventista espalhada pelo mundo.
A Situação Européia
Como já referimos , até o início da década de 50 a Cristologia adventista nos países da Divisão Sul-européia estava em linha com os ensinos da igreja em geral. Desde então, a despeito da importância dada ao problema da natureza humana de Cristo na literatura dos adventistas de fala inglesa, nenhuma controvérsia havia ainda emergido desse lado do Atlântico.
Afora alguns poucos especialistas, não muitos adventistas se entregaram à leitura de livros de teologia em inglês. Além disso, os especialistas que tomaram interesse nas sutilezas do problema em questão foram mesmo escassos. Em 1969, o editor da Revue Adventiste, Jean Caseaux, foi o primeiro a publicar os princípios da nova teologia.
Alfred Valcher, o pai dos teólogos adventistas de fala francesa, também dedicou um artigo sobre “A Dupla Natureza Divino-Humana de Cristo”, no qual analisou as várias tendências do pensamento na Igreja Adventista.
A única observação pessoal expressa neste artigo concernia à palavra “semelhança”, que para ele não era “sinônima de identidade”. “E se alguém sustenta que Jesus assumiu uma natureza pecaminosa, isso significa unicamente que Ele aceitou a realidade da tentação e a possibilidade de pecar.” A questão de saber se Cristo tinha a natureza de Adão antes ou depois da queda não parece preocupar Vaucher. Em sua magistral obra, Histoire du Salud (História da Salvação), ele se satisfez em afirmar a simples realidade de Sua humanidade e Suas tentações.
É difícil determinar exatamente quando a nova teologia se tornou conhecida dos pastores e membros da igreja na Europa. No ensino ministrado no Seminário Adventista de Collonges, onde pastores de muitos países são treinados, as duas linhas de pensamento foram apresentadas por professores como: Raoul Dederen, até ele se transferir para a Andrews University, em 1963; Georges Stéveny, de 1967 a 1980; e eu, de 1960 a 1970, e de 1985 a 1998.
Quando contatado recentemente, Raoul Dederen assegurou-me que seus pontos de vista sobre a natureza humana de Cristo eram, em substância, exatamente os mesmos defendidos por Edward Heppenstall.
Em outras palavras, Cristo tomou a natureza de Adão após a queda, mas sem participação nas tendências naturais para o mal – uma carne semelhante a do pecado, mas não idêntica. Quanto às opiniões de Georges Stéveny, temo-las por escrito e bem detalhadas, graças a seu recente livro A La Découverte du Christ (A Descoberta de Cristo).
Georges Stéveny, “Na Esteira dos Pioneiros”
Georges Stéveny estudou teologia no Seminário Adventista de Collonges-sous-Salève e recebeu seu diploma de pós-graduação em filosofia na Universidade de Genebra. Depois de muitos anos lecionando, ele serviu a Igreja Adventista por 18 anos como pastor-evangelista na França e na Bélgica. Brilhante orador, Stéveny fascinou muitas vezes grandes auditórios com seus argumentos filosóficos e bíblicos.
Chamado para ser professor de teologia no Seminário Adventista de Collongessous-Salève em 1967, foi ele posteriormente guindado à liderança da instituição, de 1970 a 1980. Deu continuidade a seu ministério como presidente da Associação Franco-Suíça e secretário geral da Divisão Euro-Africana dos Adventistas do Sétimo Dia, de 1985 a 1990.
Embora houvesse escrito muitos artigos e auxiliado na edição de muitas obras publicadas, teve ele de esperar até sua aposentadoria para escrever A La Découverte du Christ, que representou a colheita do conhecimento e das meditações espirituais de toda a sua vida.
Esses foram apresentados em forma de uma Cristologia de dois níveis. Primeiramente como a “Baixa Cristologia”, arraigada na história que nos capacita a descobrir Cristo em Sua vida terrena. Então, num segundo nível, a “Alta Cristologia”, que era a revelação do Cristo de nossa fé. Essa parte de sua obra é de particular interesse porque trata diretamente da Encarnação, suas implicações e conseqüências.
O método seguido é a apresentação da exegese sistemática para cada texto cristológico, começando com o Prólogo do evangelho de João, seguido por passagens-chaves das epístolas de Paulo. Essa é uma Cristologia inteiramente baseada no estudo da revelação bíblica.
O estudo leva o leitor através da demonstração de que “Jesus era Deus antes de Sua encarnação”, e “permaneceu inevitavelmente Deus acima de Sua humilhação.” “Mas em Cristo, o próprio Deus habitou conosco. Ele Se fez homem, o segundo e último Adão. Surge, porém, uma questão, indubitavelmente delicada, mas legítima: Quão identificado conosco realmente estava Jesus? Tomou Ele a natureza de Adão antes ou após da queda?”
Georges Stéveny rejeitou categoricamente a noção de que Cristo possuía a natureza de Adão antes da queda. A expressão paulina “em semelhança (similitude) de carne pecaminosa” não poderia ser atribuída a Adão antes da queda. Mas, “não é suficiente denunciar a diferença entre as duas situações experimentadas pelos dois Adões, o que é totalmente óbvio. O que precisamos reconhecer é que eles não viveram na mesma carne nem na mesma natureza.”
“Dizer que Jesus viveu na carne semelhante à de Adão antes da queda é, portanto, discordar da divina revelação. Mas seria outro erro dizer que Ele era idêntico a Adão após a queda.
Prendemo-nos a falsas opções ao querermos definir a natureza de Jesus simplesmente em relação a Adão, antes ou depois da queda. Uma enorme e essencial diferença que distingue Jesus do homem, o qual se tornou ontologicamente separado de Deus.” “Jesus não era apenas Deus; não era apenas homem. Cristo ocupou uma posição diferente, uma nova posição, no começo de uma nova era.”
Mas, então, “qual é exatamente a carne de Cristo e quais as Suas inclinações interiores? Até onde vai Sua identificação conosco?”902 Para renovar a condição humana, tinha Ele de assumi-la inteiramente. Uma mera semelhança externa não está em harmonia com a declaração de Paulo, de que Deus enviou Seu Filho em “semelhança de carne pecaminosa” (Rom. 8:3). “Foi na carne que Deus condenou o pecado por Jesus Cristo.
A demonstração do apóstolo Paulo é válida apenas para uma condição formal, para dar a conhecer que Jesus resistiu sob as mesmas condições que as nossas. Não admitir isso é dizer que toda a argumentação é falha e a conclusão inaceitável: ‘... para que a justa exigência da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.’ (Rom. 8:4)”
“Se Jesus não houvesse enfrentado a tentação sob as mesmas condições que as nossas”, assevera Stéveny, “a luta seria desigual e Seu exemplo impróprio.”
Mas o poder do Espírito, através de quem Cristo condenou o pecado na carne, é oferecido a todos os que O recebem pela fé. Conseqüentemente, “graças a Jesus Cristo o Espírito Santo desenvolve em nosso favor o mesmo ministério que Ele cumpriu em favor do Filho de Deus. Nisso repousa um aspecto essencial do evangelho... Quão confortador é saber que a humanidade, comprometida por Adão, seu líder, pode ser regenerada por Jesus Cristo, em Quem todas as coisas são feitas novas.”
William G. Johnsson Tenta Harmonizar
Numa série de cinco editoriais publicados na Adventist Review, William G. Johnsson, editor chefe, tentou amainar a discussão sobre a natureza de Cristo em seus artigos “Nosso Incomparável Salvador”. “Meu propósito nesses editoriais não é tentar provar que um lado está certo e o outro errado. Espero reconciliar-nos apresentando fielmente as preocupações de cada lado e mostrando quanto temos em comum, a despeito de tudo. Não espero mudar as mentes; desejo apelar para a sabedoria e o bom senso de nosso povo, em quem deposito grande confiança.”
Tendo salientado que os adventistas confessam a completa e eterna divindade de Jesus Cristo, Johnsson enfatizou que Sua humanidade é igualmente vital. Mas é precisamente aí que jaz o pomo da discórdia entre os adventistas contemporâneos. Johnsson recapitulou objetivamente ambos os pontos de vista e então perguntou: “O que a Bíblia nos diz sobre a humanidade de Jesus?” A resposta foi exatamente aquela dada em seu livro sobre a epístola aos Hebreus.
“O silêncio do Novo Testamento sobre esse específico ponto de debate é ensurdecedor. A meu ver nós, como igreja, somos prudentes em não tentar definir em nossas crenças fundamentais a natureza humana de Cristo, mais detidamente do que o faz a Escritura.”
“Mas o que Ellen White nos diz acerca de Jesus?”911, Johnsson pergunta. Ela enfatizou Sua divindade tanto quanto Sua humanidade e a miraculosa unidade entre ambas. “Ele padeceu tristezas, sofrimento e tentação; Suas provações foram reais – Ele Se arriscou ao fracasso e à perda eterna. Porém, em meio a tudo isso, Ele Se manteve perfeitamente impecável; Ele é nosso incomparável Salvador.”
Se Ellen White nos estimulou a estudarmos a humanidade de Jesus, também se esforçou para nos relembrar que devemos fazer isso com extremo cuidado: “Sejam cuidadosos, extremamente cuidadosos quando tratando da natureza humana de Cristo.” Mas o que ela disse sobre Sua natureza? Era a de Adão antes ou depois da queda? Para saber disso “precisamos atentar para o que ela escreveu e não escreveu a respeito”.
Ellen White, que fez múltiplas referências aos “fundamentos” ou “pilares” da mensagem adventista, nunca mencionou a natureza humana de Cristo como sendo um deles.
Ademais, é fácil descobrir declarações dela para apoiar cada ponto de vista. De fato, notou Johnsson, Ellen White afirmou que “conquanto Jesus Se tenha tornado verdadeiramente humano e passado por nossas experiências, Ele era diferente de nós em aspectoschave. Cristo era Deus-Homem e não participou de nossas paixões, inclinação para o mal e propensões para pecar.
Ele era semelhante a nós e todavia diferente de nós. Somente tendo esses dois fatos em mente podemos fazer justiça a ela.” Com freqüência, observou Johnsson, os argumentos não tocam no problema real – a natureza do pecado. “A questão por trás da questão é o conceito de pecado. Aqueles que pretendem compreender mais claramente a natureza humana de Cristo, conseguiriam mais se parassem de debater se Jesus veio em natureza humana pré ou pós-queda, e despendessem tempo buscando saber o que a Bíblia diz a respeito do pecado.”915
Johnsson sustentava que a Bíblia não restringe a definição de pecado à transgressão da lei. “Em penetrante análise, Paulo descreve o pecado como uma força, um princípio inato, um estado – ‘o pecado habita em mim’(Rom. 7:14-20). Assim não somente nossos atos são pecaminosos; nossa própria natureza está em guerra contra Deus.”
“Possuía Jesus tal natureza? Não. Se assim fosse, Ele teria necessidade de um Salvador. Ele não possuía propensão para o mal; nenhuma deformação em Sua natureza moral que O predispusesse à tentação. Ele é o único totalmente sem pecado – em ações e também em Seu ser interior. Ele é ‘santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores’ (Heb. 7:26).”917 “Mas eu necessito de um Salvador que é diferente, alguém que não participa do problema do pecado, que não de 1994) e disicutida em nosso capítulo 14 necessita Ele próprio de um salvador. E meu Salvador deve não apenas estar livre da mancha do pecado, mas também ser o próprio Deus! Somente Deus pode remover meus pecados.”
O esforço de Johnsson para resolver o problema é, sem dúvida, digno de louvor.
Inquestionavelmente, o primeiro passo para a solução jaz na definição bíblica do conceito de pecado. As aparentes contradições entre a decaída, sofredora e degradada natureza humana que Cristo assumiu, e a pura, santa e impecável natureza que todos Lhe atribuem, não encontrarão de outro modo uma explicação capaz de reconciliar dois pontos de vista radicalmente opostos.
Entretanto, para alcançar esse propósito, não é suficiente declarar o que Cristo é ou não é. Cada adventista crê que Jesus era impecável, que Ele não tem em Si más propensões, e que somente poderia ser nosso salvador nesse estado.
Precisa ser explicado como Ele pôde ser tentado em todas as coisas como nós, em carne semelhante à carne pecaminosa, sem cometer pecado. Essa é a verdadeira essência do problema. Mas quando o impasse é resolvido, Cristo surge mais efetivamente como nosso incomparável Salvador.
Jack Sequeira e o Problema do Pecado
Em seu livro Beyond Belief, Jack Sequeira busca a solução para o problema da natureza humana de Cristo na definição bíblica de pecado. Como sugerido no título, o autor pretende conduzir seus leitores “além da crença”, para “a promessa, o poder e a realidade do evangelho eterno”.
Sequeira está mais interessado em Soteriologia do que em Cristologia; ele busca colocar “o plano da salvação sob uma nova luz”. Mas, uma vez que não se pode falar da obra de Cristo sem falar de Sua pessoa, Sequeira é compelido a tomar posição sobre a natureza humana de Cristo e a natureza do pecado. Para ele, “o evangelho é a solução de Deus para o problema do pecado. Assim, é importante principiar nosso estudo do evangelho compreendendo o pecado.
Amiudadamente tentamos compreender a solução que Deus nos preparou em Cristo (o evangelho), sem primeiro reconhecer a plena extensão do problema... Unicamente quando compreendermos nossa completa pecaminosidade em natureza e ação, entenderemos a solução de Deus.
Até percebermos a depravada natureza do pecado, não perderemos nossa confiança própria nem tornaremos para Cristo como nossa única justiça. O evangelho torna-se significativo, então, unicamente contra o pano de fundo de uma plena compreensão do pecado.”
Sequeira então traça a origem e o desenvolvimento do pecado. “Como descendentes de Adão e Eva, somos todos escravos do pecado. Nascemos egoístas e nossa inclinação natural é viver independentemente de Deus (ver João 8:34; Rom. 1:20-23; 6:17).” O Velho Testamento se vale de uma dúzia de diferentes termos para pecado.
Mas no Salmo 51:2 e 3, descobrimos conceitos básicos expressos em três palavraschave: iniquidade, pecado e transgressão.“a.) Iniqüidade. Ela não se refere primariamente ao ato do pecado, mas à condição de pecaminosidade; por natureza, somos espiritualmente ‘inclinados’ (ver Sal.51:5; Isa.53:6; 64:6). b.) Pecado.
Literalmente ‘perder a marca’. Isso se refere ao nosso fracasso em alcançar o ideal de Deus (ver Rom. 3:23; 7:15-24; Isa. 1:4-6). c.) Transgressão. Ela é uma deliberada violação da Lei de Deus, um ato espontâneo de desobediência (ver I João 3:4; Rom. 7:7-13).”
Comentando Isaías 53:6, Sequeira escreve: “Primeiro, cada um de nós se desviou porque todos seguimos a inclinação natural para o ‘próprio caminho’. Segundo, esse pendor de seguir nosso próprio caminho, essa autocentralização, é a iniqüidade que foi posta sobre Cristo, nosso Portador de pecados. Quando Ele ‘condenou o pecado na carne’ sobre a cruz (Rom. 8:3), foi a inclinação para o pecado que Ele sentenciou.”
Deus enviou Seu Filho em carne pecaminosa, não para provar a Seus filhos que eles poderiam igualmente obedecer a lei de Deus ou para servir como um exemplo para eles, mas para libertá-los do pecado. “No próprio centro da doutrina da Cristologia está a gloriosa verdade de que Cristo assumiu a humanidade para poder ser o Salvador do mundo. Unicamente àqueles que primeiramente o receberam como Salvador, tornou-Se Ele um Exemplo.”
Tendo explicado o porquê da Encarnação, Sequeira também considerou o como. “Como Cristo salvou o gênero humano em Sua humanidade? “Isso se deu vicariamente com Cristo agindo no lugar da raça humana, ou realmente, isto é, com Cristo assumindo a decaída natureza da humanidade?” Sequeira opta pela última, rejeitando a idéia da substituição vicária, a qual diz ele “tornar o evangelho antiético”. Que um homem inocente pudesse morrer em lugar de um culpado é inaceitável. Ademais, isso reduz mui facilmente o evangelho a “graça barata”.
De acordo com Sequeira, “Cristo, em Sua humanidade, salvou os homens e as mulheres em realidade e não vicariamente. Os defensores dessa posição ensinam que Cristo tomou a natureza que Adão possuía após a queda.
Argumentam eles que uma vez que Cristo veio para salvar a decaída humanidade, Ele tinha de assumir a natureza humana pecaminosa que necessitava de redenção. Identificando-Se assim com nossa coletiva humanidade degenerada, Cristo qualificou-Se a ser o segundo Adão e legalmente obteve o direito de ser nosso Substituto.”928
Para Sequeira isso não significa que Cristo em Sua humanidade teria sido exatamente como nós em nossa caída humanidade. Certamente, “a Escritura ensina que Cristo realmente assumiu nossa condenada natureza humana pecaminosa como nós a conhecemos.
Mas Ele derrotou completamente “a lei do pecado e da morte” (Rom. 8:2) que habitava nessa natureza humana pecaminosa, e então a executou na cruz. Houvesse Cristo consentido, mesmo por um pensamento, com os pecaminosos desejos da natureza que Ele assumiu, então Se teria tornado um pecador com necessidade, Ele próprio, de um salvador. Eis por que, lidando com a natureza humana de Cristo, devemos ser extremamente cautelosos para não induzir Sua mente ou escolha ao pecado ou dizer que Ele ‘teve’ uma natureza pecadora.”
Com respeito ao problema do pecado, Sequeira enfatiza que não deveríamos ir além do que a Escritura diz. “Não devemos ensinar que em Adão toda a humanidade herdou a culpa. Esta é a heresia do ‘pecado original’ introduzida por Agostinho e adotada pela Igreja Católica Romana.
Culpa, em sentido legal, sempre inclui volição pessoal ou responsabilidade e Deus não nos torna pessoalmente responsáveis por algo pelo qual não tivemos escolha. Somente quando pessoal, conscienciosa, deliberada, persistente e definitivamente rejeitamos o dom da vida eterna em Cristo, a culpa, a responsabilidade e a segunda morte tornam-se nossas (ver João 3:18, 36; Marcos 16:1; Hebreus 2:1-4; 10:14, 26-29).”
A Cristologia de Sequeira é apenas um fundamento de sua teologia com respeito a como os pecadores são salvos “em Cristo”. Sua posição intransigente contra a expiação substitutiva tem-se provado controversa, mas ele claramente assume postura favorável à Cristologia tradicional, baseando seus argumentos na Escritura e não em Ellen White.
A Derradeira Declaração de Ellen White Sobre a Natureza Humana de Cristo
Começamos este estudo histórico focalizando 150 anos de Cristologia, com a primeira declaração de Ellen White. Daremos o toque final a essa história com uma de suas últimas afirmações. Essa intrigante manifestação foi descoberta apenas recentemente e trata com a parte mais controversa do assunto: se Cristo estava sujeito a todas as “más tendências” da humanidade ou se Ele era isento delas.
Nossa pesquisa confirma a de George Knight, que afirma que Ellen White nunca usou a expressão “tendências pecaminosas” em relação à natureza humana de Cristo. De acordo com
Knight, isso fazia parte dos “ensinos de Prescott, Waggoner e Jones sobre as tendências da natureza humana de Cristo”, que “permeavam o clima adventista em meados da década de 1890”. Mas a recém descoberta carta levanta a questão sobre se ela realmente usou uma expressão tão forte.
A Adventist Review de 17 de fevereiro de 1994 anunciou que uma carta inédita de Ellen White havia sido descoberta recentemente. Escrita em 29 de agosto de 1903, em Elmshaven, Sta. Helena, Califórnia, essa carta foi dirigida ao Dr. J. H. Kellogg.
Parece que ela nunca foi enviada, como foi o caso com muitas outras retidas por Ellen White, enquanto aguardava para ver como a controvérsia com Kellogg se desenvolveria entre 1902 e 1908. Qualquer que seja a razão, essa carta, ou sua cópia, estava fora dos arquivos. O arquivista Tim Poirier descobriu-a totalmente por acaso em dezembro de 1993. Quando o anúncio da descoberta foi feito, o Patrimônio White ofereceu uma cópia a todos aqueles que desejassem tê-la.
Como a maioria das cartas de Ellen White, ela trata de vários assuntos de natureza prática. Mas um dos parágrafos tocou no assunto da humanidade de Cristo em termos particularmente significativos.
Ao revisar a passagem na qual ela fala da natureza humana decaída assumida por Cristo, Ellen White fez várias alterações manuscritas no texto. Essas mudanças são apresentadas abaixo em negrito. Essa amostra de seu trabalho testifica de sua preocupação com a clareza sobre um ponto particularmente sensível e passível de mal-entendidos. Eis o parágrafo em questão:
“Quando Cristo, no início, anunciou à hoste celestial Sua missão e obra no mundo, declarou que estava para deixar Sua posição de dignidade e ocultar Sua santa missão assumindo a semelhança do homem, quando em realidade Ele era o Filho do infinito Deus.
E quando chegasse a plenitude dos tempos, Ele desceria de Seu trono do alto comando, poria de lado Seu manto régio e coroa real, revestindo Sua divindade com a humanidade, vindo à Terra para exemplificar o que a humanidade deve fazer e ser para vencer o inimigo e assentar-se com o Pai em Seu trono. Vindo como o fez, como um homem, para enfrentar e estar sujeito a todas as más tendências das quais o homem é herdeiro, operando de toda maneira concebível para destruir Sua fé, consentiu em ser ferido pelas agências humanas inspiradas por Satanás, o rebelde que havia sido expulso do Céu.”
Esse texto tem paralelo com algo que Ellen White publicara no Early Writings. Ali ela usou, pela primeira vez, a expressão “natureza humana decaída” para descrever a natureza assumida por Cristo. Na declaração de 1903, desejou ser ainda mais precisa.
De início ela escrevera: “Vindo como O fez, como um homem, com todas as más tendências das quais o homem é herdeiro, a Si mesmo tornou possível ser ferido pelas agências humanas inspiradas por Satanás.” Isso pareceria ser um claro apoio a uma natureza humana sujeita a “todas as tendências más”, às quais Cristo nunca cedeu.
Mas, evidentemente, Ellen White, ao reler o texto datilografado, sentiu que esse não era exatamente o pensamento que pretendia comunicar. Assim, adicionou duas frases manuscritas as quais foram negritadas no texto acima.
Com o texto interlinear acrescentado, a passagem ficaria assim: “Vindo como fez, como um homem, para enfrentar e estar sujeito a todas as más tendências das quais o homem é herdeiro, operando de toda maneira concebível para destruir Sua fé, consentiu em ser ferido pelas agências humanas inspiradas por Satanás.” Alguns diriam que essa revisão apresenta significativa mudança de sentido, fazendo parecer que as más tendências estavam em outras que foram formadas contra Cristo, embora isso seja discutível.
Ao publicar essa importante passagem, o editor da Adventist Review escreveu com propriedade: “Os estudantes dos escritos de Ellen White estarão interessados na sentença final desse parágrafo. Eles irão observar como ela estava preocupada em não ser mal compreendida e, ao ler o rascunho datilografado, fez mudanças de próprio punho para tornar mais claro o significado. Essa asserção tomará seu lugar entre muitas outras que ela escreveu sobre a natureza humana de Cristo.”
Segundo Paul Gordon, então diretor do Patrimônio de Ellen G. White, “não é provável que qualquer nova carta mude significativamente a compreensão adventista de seus [Ellen White] ensinos. Temos já uma imensa coleção dos seus escritos em livros, cartas, diários e manuscritos, pela qual podemos estar confiantes em saber o que ela cria.”
Nos parágrafos seguintes, Ellen White explicou o segredo da vitória de Cristo sobre as “más tendências”. “Como Cabeça da humanidade, Cristo viveu na Terra uma vida consistente e perfeita, em conformidade com a vontade de Seu Pai celestial.
Quando Ele deixou as cortes celestiais, anunciou a missão que Se propusera cumprir: ‘Eis aqui venho; no rolo do livro está escrito a Meu respeito: Deleito-Me em fazer a Tua vontade, ó Deus Meu.’ Sempre supremo em Sua mente e coração estava o pensamento: ‘Não a Minha humana vontade, mas a Tua vontade seja feita.’ Esse era o infalível princípio que O movia em todas as Suas palavras e atos, e que moldou Seu caráter.”938
Desse modo, tendo vencido “todas as más tendências das quais o homem é herdeiro”, Jesus Cristo, nosso Senhor, “deu-nos um exemplo do que homens e mulheres precisam ser, se escolherem ser Seus discípulos e mantiverem o princípio de sua confiança até o fim.” Pois, “através de Sua experiência, durante os 33 anos que Ele viveu na Terra, Cristo foi assediado por todas as tentações com as quais a família humana é tentada; contudo, Ele Se manteve sem sequer uma mancha de pecado.”
Tendo chegado ao fim de um estudo abrangendo 150 anos de Cristologia Adventista, nosso propósito é proceder a uma síntese do conhecimento obtido até aqui e lançar a base para avaliação das diferentes posições.
Em última análise, esperamos sugerir uma Cristologia que se harmonize com o ensino bíblico e reconciliar os diferentes pontos de vista.